domingo, 18 de junho de 2017

TROPEIRISMO NOSSO, Antônio Gonçalo de Souza,

TROPEIRISMO NOSSO, Antônio Gonçalo de Souza, 300p, Expressão gráfica editora, 2016 isbn (sem).




XII Bienal do livro. Ancorei no stand Casa Juvenal Galeno e lá expus e vendi meus livros aos visitantes da feira. Alguns, eu fui buscar no largo corredor.

Junto comigo, no stand, estavam autores ligados à casa Juvenal, alguns sentados comodamente e poucos minerando. Escritores dos quatro cantos do Ceará com livros brilhando tentadores nos mostruários ao longo das paredes, aguardando leitores.

Fiquei na feira nos dias 20, 21, 22 e 23 de abril de 2017, caído de um caminhão de mudança, igual àquele gato do adágio popular. Acho que foi no 20 de abril, ainda não chegara o feriado de Tiradentes que lotou a Bienal e mais livros que eu tivesse, venderia! Então, na tarde do dia 20, uma quarta-feira modorrenta, pouca gente circulando, os escritores sentados em volta da mesa de autógrafo, batendo papo à toa. Eu me sentia um estrangeiro ali, pisando em ovos.

Para me entrosar, correndo riscos, acheguei-me à mesa, temperei a garganta para chamar a atenção, e propus que trocássemos nossos livros uns com os outros. Eu não vislumbrava possibilidade de vender mesmo naquela feira morta da quarta. Alguns dos escritores, que deveriam ser ilustres, membros de academias, sequer haviam me percebido intrujado na área deles. Todos me olharam. Antônio Gonçalo, que eu ainda não percebera no meio, levantou a mão e começou a autografar “Tropeirismo Nosso”.

O livro de Antônio Gonçalo era massudo e me interessava, eu já o namorara no mostruário. Meus ancestrais foram tropeiros aqui em Sergipe: Bernardino Ferreiro transportando barras de ferro de Maroim para as forjas de Itabaiana e Zé Saracura pai levando cereais para os saveiros do Rogue Mendes, nos portos fluviais de Japaratuba.

Assim como Antônio Gonçalo, outros escritores aceitaram o desafio: Rejane Costa Barros (Água do Tempo), Neuzemar Moraes (Portugal e o Brasil nos Oceanos da História), Ana Maria Nascimento (Nuances do Caminho), Tibúrcio Bezerra (Obrigado Cantador), Nice Arruda (Quase tudo de mim...).
Essa permuta foi boa, tenho recebido comentários pelo wsap e-mails. Estou sendo lido pelos escritores do Ceará! Pelo menos, os que encontrei na Casa Juvenal Galeno.



Em Aracaju, logo que sobrou tempo nessa correria de lançadeira que é a vida, li “O Tropeirismo Nosso”, como quem recupera um caderno de anotações de um ancestral perdido no passado. Leitura gostosa para qualquer pessoa, tenha ou não no sangue o nomadismo das tropas ou espírito de aventureiro dos desbravadores. Bem escrito, bem revisto, consistente. Não parece uma homenagem à família dos intrépidos Araripes do Ceará. Senti-o como um romance, com trechos alegres, trechos heroicos, sem se afastar do resgate ao cotidiano desses bandeirantes ciganos, que fizeram circular a riqueza dos sertões do Brasil. O livro está segmentado em: A família, o tropeirismo, o sítio Sanharol, a vida de tropeiro, a decadência, testemunhos de contemporâneos, entre outros.

A saga de tropeiros lendários do Ceará, que fizeram história e uniram mais o País inclusive nas conversas às sombras da árvores do sopé da serra do Quincuncá ou em outro qualquer lugar. Desde São Paulo (Casa de Fundição de Taubaté, a Oficina Real dos Quintos), Minas Gerais, Bahia e o nordeste inteiro, transportando ouro bruto das minas, lingotes, dinheiro para saldar débitos, mercadorias, especiarias, carne seca, farinha, cultura, esperança...

Várzea Alegre ficou em minha alma como uma cidade especial.

A maioria das pessoas com quem mantive contato na Bienal possuía vínculos fortes com ela. Escritores ou simples visitantes na feira literária. E eu nunca ouvira falar de Várzea Alegre. O sítio Sanharol, lugar mítico, povoado de heróis, desbravadores, um reino dentro do império da Várzea Verde vestiu-se de Sítio Saracura da Terra Vermelha de Itabaiana. Na casa Juvenal Galeno, pelo menos, Várzea Alegre e Sanharol tomaram conta do Ceará inteiro como se não houvesse mais nada, nem Fortaleza. A imagem que construí pode nem ser a sombra do sítio real, mas é a que quero preservar, como se fosse uma passárgada ou um são saruê.

Não sei não!


Será mesmo verdade que a designação romeiro vem do nome Romão de Padre Cícero. Sempre imaginei que viesse de romaria, viagem à Roma, lugar santo dos cristãos.  Pura coincidência que Cícero tenha Romão como sobrenome? Outra... Aqui em Sergipe, pelo menos nas pubas que preparávamos no sítio Saracura de minha infância, com as quais fazíamos os bolos e os pés de moleques de sabor incomparáveis, ninguém extraía goma nenhuma (páginas 182 e 183).

Nota final: Passei o livro "Tropeirismo Nosso" para o escritor Pedro Meneses, tropeiro, descendente de tropeiros e estudioso do assunto. A obra comporá o acervo do Museu Dona Maria, no Recanto da Serra, em Tobias Barreto. 

quinta-feira, 15 de junho de 2017

VIDA LIDA, Tereza Cristina Pinheiro Souza

VIDA LIDA, Tereza Cristina Pinheiro Souza, poesia, 2016, Infographics, 138 páginas



Minha esposa está lendo menos depois das redes sociais, nas quais entrou na marra (mea culpa). Está mais seletiva na escola das obras, só recomendadas, de preferência por  internautas, ou de autores conhecidos.

Ela conheceu Tereza Cristina nas sessões da Academia Itabaianense de Letras (acompanha-me solidária) e nas festas culturais do dia 14 na Praça Chiara Lubich de Itabaiana, onde tenho, em nome da mesma academia, uma tenda fixa.

Logo que botou as mãos no livro “Vida Lida” de Tereza Cristina, tomou conta da rede da varanda lá de casa, e navegou fagueira. Comecei a ver louvores aos poemas, curtidas, bonequinhos moganguentos fazendo mesuras, e ouvir vivas, ohs e urras...


A poesia é como o mar, gosto de ficar olhando de longe, temo os monstros das profundezas que comem gente. Meu tempo é escasso e achei que poderia deixar “Vida Lida” para depois, satisfeito com o efeito que ele produziu na crítica literária dos livros que escrevo. Mas minha esposa percebeu a fuga e pegou no meu pé: “Leia logo!”
Ela tinha razão! Paris é outra vista de dentro. Nada é tão belo como mergulhar na lua que inunda o terreiro do sítio Saracura nas noite de estio. Ouvir falar nem chega perto!

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Lá vêm as letras querendo ser poesia, mostrando força e poder, tecidas em palavras poderosas pelos dedos e pela mente de Tereza. Pegam o mundo em movimento, com dúvidas e com defeitos, e o refaz inteiro. Com um simples toque, parece milagre!

Que força é essa que as palavras têm de me acordar ainda no sonho, um pé lá e outro cá, para continuar lembrando-me deste sonho que me deu trabalho para acordar. Como é maravilhoso sentir o amanhã, poder sorrir e amar nele...Vou procurar uma moldura (espero que eu saiba escolher) para enfeitar e segurar os meus olhos (sonhadores), que não percam de vista a alegria de viver.

Tereza Cristina navega dentro de si, conformando-se com os revezes. “Querer ir” é melhor mesmo do que “ter ido”. E, por isso, ela busca “querer” ser feliz, a cada instante. E consegue, porque o poeta (já falou outro poeta) é um fingidor, “finge tão completamente, que chega a fingir que é dor, a dor que deveras sente”.

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Lembranças de Vovô Boanerges eu achei lindo, “me diga aí, quem souber, quem é o meu cravo branco?

Maria Fulô mexe com o coração, acorda sentimentos íntimos, os olhos marejam, o nariz coriza...Se a escola fosse um canto / pra se aprendê bem vivê! / qui além da fiarada / inté eu andava istrada / pro mode, quem sabe lê!

Em Momento Um, mesmo de mãos atadas  eu quis, eu lhe quis, eu quis sim. E no final, de “Mãos Atadas” outra vez, eu quis o certo no tempo incerto... Eu sou tantas / em pensamento vou a muitos lugares...


Acho (agora sou eu mesmo) mais prudente parar por aqui as citações. Os omitidos certamente não gostarão, mereciam tanto também! Além do que, o livro não está esgotado e, certamente, por mais que eu capriche na escrita, ele vem das misteriosas minas da serra de Itabaiana.

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Eu fico me perguntando por que Tereza Cristina doa-se tanto, anula-se, até esconde-se dentro de si para que seu brilho não ofusque os brilhos em volta, para que suas tristezas sejam vistas como felicidade.  

Uma vez eu a convidei para ingressar na Academia de Letras e ela me disse: “bote meu irmão que é poeta!”. Eu respondi-lhe que ele iria mas a queríamos também.  Outras forças se somaram para conquista-la. Que bom que a Academia deu-lhe força e obrigação para revelar o brilho que escondia.  “Vida Lida” mostrou, até para a autora, agora desprendida, agora descamada (como ela mesma diz), que as pessoas precisam ler seus poemas, valem muito a pena. Assim é que, sem timidez, eles estão cruzando os céus nebulosos das redes, soltos, livres e anchos, alumiando-nos.

Maria do Carmo Costa, navegante das redes sociais e autora de dois pequenos grandes livros (Alma Branca e Para sempre Itabaiana, você precisa ler!) tomou minha palavra final (obrigado Carminha): “Ele (o livro Vida Lida) revela você (Tereza), traz à tona seus sentimentos mais profundos, amores, amigos, a sua visão do mundo, postos e expostos como só você poderia... Seus versos extravasam alegria, melancolia, saudades, tenacidade, amor, experiências vividas e sabedoria adquirida”. 

Temos que ler mais poesia, faz muito bem!

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Resenha publicada na revista Impactos, ano I número 1, junho de 2017 (Itabaiana Sergipe)

(Aracaju, abril de 2017, por Antônio Saracura, escritor das academias Sergipana e Itabaianense de Letras).