segunda-feira, 18 de abril de 2016

SIZENANDO E ADELAIDE, Ana Maria Nunes Espinheira,

SIZENANDO E ADELAIDE, Ana Maria Nunes Espinheira,2006, sem editora, patrocínio Banese,197 páginas sem isbn



Tempos atrás (provavelmente em algum mês de 2006) li em algum jornal ou revista, uma notinha sobre um livro chamado, “Sizenando e Adelaide”, e que seriam memórias sobre a casa grande de engenho que se vê à margem da estrada Estância à Santa Luzia do Itanhy, um pouco ao largo. Recortei e colei no meu quadro de lembretes. Iria procurar o livro, pois aguçou-me. Havia uma alma boa habitando aquelas duas dúzias de letras se muito.  

O tempo passou e não tive notícias mais do livro. Ninguém do meu círculo comentou sobre ele e nos sebos e livrarias da cidade não apareceu. Mas a notinha continuou pendurada no meu quadro de lembretes, faiscando e, com o tempo, por causa talvez da bateria gasta, já quase parando de faiscar.  

Quando eu menos esperava e nem estava mais tão ligado ao aguçamento inicial, ao fuçar a prateleira de livros sergipanos na Escariz, eis que me bato com um exemplar perdido do livro. Tomei até um susto, era fantasma de minha família. Senti-o assim, nem sei por que. O livro custava barato e não relutei. Comprei-o  e, em casa, li de um fôlego.

E digo que valeu muito a pena.

Memórias e romance. Ritmo, muita alma. Emociona. Um excelente livro sem favor nenhum. A autora, que diz ser parente dos troncos dos senhores do Engenho São Felix, o tal da estrada citada, conduz com firmeza sua narrativa romanceada. Não passa nem perto da pieguice comum nas sagas familiares e nem espanta o leitor com a monotonia pedante das citações dos historiadores da academia.  É consistente e coerente em todo o seu desenrolar, sem nada mais além do que precisa dizer para contar uma fantástica história. A autora utilizou os documentos dos antepassados e muito critério.

A narrativa começa em 1821, quando nasce Paulo de Souza Vieira, no engenho “Poções”, em Lagarto.   Depois vem a construção do engenho “São Feliz”, a expansão da propriedade, que chegou a ter 4 mil tarefas.  O casamento de Paulo com Joaquina Ermelinda, filha dos donos do engenho “Antas”, em Santa Luzia. A morte trágica de Paulo deixando seis filhos pequenos, entre os quais, Sizenando. O novo casamento de Joaquina com João José, senhor do engenho “Santa Sofia do Rio Branco” do Conde, na Bahia, viúvo e pai também de seis filhos pequenos, entre os quais Adelaide. E por aí vai, assustando, encantando, informando...

Nos dias de hoje, as terras do antigo engenho, reduzem-se a poucas tarefas de terra. O velho sobrado, arrodeado de janelas (16 olhando a estrada), acaba de ser inteiramente reformado. O atual proprietário, Gilberto Vieira Leite Neto, tetraneto de Sizenando, está plantando canas e deve botar o engenho para moer qualquer dia desses (está no livro).  

Duas surpresas a comemorar: o livro, “Sizenando e Adelaide!”, e a ressurreição do São Félix, vai moer de novo, inacreditável!

Post Scriptum: 
Tenho passado pela estrada, ao lado de São Félix, nestes anos que se sucederam à publicação do livro e também à leitura que acabo de registrar, e não vejo fumaça saindo da chaminé, nem partidos de cana pendoados ao vento, nem carros de bois gemendo a subir ladeiras ou a escapar de atoleiros.  Nem tenho visto, daqui da estrada daria para ver bem, a faina de trabalhadores que sempre há nos engenhos vivos.

Será que o São Félix continua fogo morto?  


quinta-feira, 14 de abril de 2016

ADEUS MINHA QUERIDA, Raymond Chandler

ADEUS MINHA QUERIDA, Raymond Chandler, Alfaguara, 2016, 310p, isbn 978-85-5652-002-9



Raymond Chandler enfrentou na sua vida literária, ele diz, o mesmo drama que vive cada escritor a cada livro que lança: uma enorme ansiedade para saber o que acharam da obra, e, depois, uma enorme irritação ao ficar sabendo. Não vou me gabar de que isso não aconteceu acontece comigo. Que agonia! Chandler já superou essa fase que não me larga, hoje é uma celebridade mundial.

Essa ADEUS MINHA QUERIDA acontece numa pequena cidade da Califórnia onde a polícia corrupta e os bandidos endinheirados convivem na mais santa paz. Nada fora do padrão!  A trama poderia levar ao desmantelamento de uma quadrinha internacional especializada em roubos de joias raras.  Pensei que fosse. Mas a suposta quadrilha apenas serve, como poderia ser qualquer outra cortina de fumaça, para esconder a identidade de uma dondoca da sociedade. Só no final do livro, é que o leitor saberá com certeza.

É um livro de homens grandes e fortes, desde o detetive Marlowe que tem mais de 1,80 até o vilão romântico, Malloy, o Alce, como um quarteirão de prédios, só para usar uma imagem, o que Chandler faz sempre. Um livro de mulheres vilãs, até a figurante-mocinha quase envereda por esse viés, foi salva por descuido do autor; de policiais corruptos e violentos. De chefes indolentes, não escapando destes sequer Randall, que pareceu o mais empenhado na função de protetor da lei. Um livro que trata de seu personagem principal com extrema malvadeza e benevolência: apanha como massa de bolo, arrisca-se desnecessariamente, bebe como uma pipa e sempre está sóbrio... Malowe apanha quando não precisava e escapa ileso quando deveria apanhar.

E toda vez que Marlowe apanha, entra em delírios, que não revelam nada, apenas toma tempo, quebra o ritmo da história. Como na vez que recebeu a cassetada de Marriott ou em outra, quando o índio fedorento botou-o a nocaute. 

Há personagens mal resolvidos, criados com empenho e depois abandonados. Como a loura espetacular, Anne Riordam. Ela tentou até ser ajudante do detetive mas foi esnobada com ironia e menosprezo. Não entendi. Anne foi essencial à elucidação dos “mistérios” e até salvou “estranhamente” a vida do mocinho. Circulava em brenhas tenebrosas como se apanhando flores. Lembrou-me, de leve Lisbeth Salander, de Stieg Larson. Talvez Anne seja uma perna do romance que o autor esqueceu ou deixou reservada para outra obra.  Acontece.

Marlowe trata a polícia como se ela fosse uma classe inútil. Um tratamento incoerente. Talvez um modismo do romance policial da época.  Eu, no lugar de Nulty, faria Marlowe engolir as “gracinhas” na hora, nem esperaria o final do expediente.

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Uma técnica que pratico na minha literatura é sustar a narrativa sufocante com fugas rápidas, deleites opostos:  Um trem que passa apitando, um carro que buzina ao longe, um bando de pássaros que retorna ao ninho no entardecer. Isso cria um tempo extra, desconectado do primeiro, possibilitando que o leitor acerte o passo. Também serve para mostrar que o suspense daqui não anula a normalidade do ambiente em volta. A tensão relaxa, e talvez por causa dessa fuga, e retorna depois ainda mais sufocante. Chandler chama isso, em carta posta no Apêndice do livro, de retardamento da ação. E garante (e eu acho que está certo) que essa “divagação” é mais importante para o leitor do que o ápice que se aproxima. Para ele não morrer antes.  Pelos “clipes” que teimavam em escapar da mão, a morte iminente fica até irrelevante para a vítima (página 300).

Chandler gasta um tempo considerável descrevendo seus personagens, mas o faz de maneira ágil: “Ela (Anne Riordan) tinha um rosto bonito, um rosto de que a gente se acostuma a gostar. Um rosto belo, mas não tão belo que você tenha que sair portando um soco-inglês toda vez que levar o rosto para passear.”  Mais à frente, referindo à mesma Anne, diz que ela é daquelas de fazer um bispo quebrar vitral com um pontapé. Para exemplificar. Usa imagens figuradas que, algumas vezes, até cansa: “o cheiro de lanchonete era tão forte que dava para construir uma garagem em cima dele”. “A Palavra ficou pairando no ar, como fumaça num quarto fechado.O rosto de Marriott ficou com a expressão de quem acabou de engolir uma abelha." E o autor saboreia suas imagens... “Ele (Marriott) se livrou dela (da abelha) com algum esforço!”. John Wax tinha olhos pequenos, famintos, de pálpebras pesadas, inquietos como pulgas”.

A escrita de Candler traz o leitor para bem perto dele e do fato: “acendi o cachimbo com todo cuidado. Ela ficou olhando com aprovação. Homens que fumam cachimbo são homens sólidos.  Ela estava prestes a se desapontar muito comigo.”. Mas não aconteceu no livro apesar de anunciada (teria que acontecer, pra que prometer o que não pode dar?).   Como se  a frase fosse de efeito, apenas para embelezar a prosa. 

Há segmentos descritivos aparentemente desnecessários ao andamento da história, mas todos com os ingredientes essenciais ao sucesso literário (mortes, cabeças espatifadas com cérebros expostos, espancamentos, dissimulações, mistérios).  Todo livro policial tem que ter. O leitor embarca e a canoa e pode ser furada. Seriam incoerências se escritas por Saracura. Vejam a injustificável saída de Anne Riordan da sala da sra. Grayle: Anne controlava a cena, estava lá antes, viabilizou a visita de Marlowe. E depois nada acontece de especial entre o detetive e a socialite que justificasse a saída de Anne. E a ida ao navio-cassino, para nada. O perigoso Brunette que não passou de um goiaba, se me permitem chamá-lo assim.  Deu-lhe um branco na maldade.  Foi localizado tão rápido como se ele fosse o único tripulante do navio. O autor talvez estivesse de saco cheio de preliminares: foi direto ao alvo.

Não me conformo com a arriscada ida ao tal navio-cassino. Desnecessária na vida e no romance. O autor jogou um balde de combustível para esquentar o livro que andava meio chocho. E arrisca a vida (não morre, por insondáveis motivos) para entregar um reles bilhete a Malloy, que poderia nem estar lá. É apenas uma boa sequência cinematográfica para encher os olhos apressados. Marlowe poderia mandar o bilhete pelo barqueiro e o objetivo seria alcançado. A saída do navio, na santa paz, é inadmissível também, pelos motivos apresentados. Saiu ileso quando tudo indicava o contrário.

Apesar de tudo que falei, é um bom livro, tanto que corre mundo e vende milhões de exemplares.  João Gama, um intelectual de escol de Sergipe, foi quem me apresentou Raymond Candler, de quem já havia esquecido a fisionomia. Um prazer!

Estou com UMA JANELA PARA A MORTE na fila de leituras.

Há um capítulo que merece destaque especial, irretocável.  É o 22. Narra a entrevista de Marlowe com chefe da polícia de Bay City e a cooptação do sanguinário policial Hemingway.

sábado, 9 de abril de 2016

DOM CASMURRO, Machado de Assis

DOM CASMURRO, Machado de Assis, (onde anda o meu exemplar? Aqui em casa livros somem misteriosamente).




Você ainda não leu?

Leu e está esquecido?

Corra logo antes de botar as mãos no novo livro de Vladimir Souza Carvalho: “Dom Casmurro, a história que Machado de Assis Esqueceu”.

Eu fiz isso é digo que o livro de Machado de Assis continua vibrante, atual, incomparável. Um ritmo gostoso, no início suave e, com o andar das páginas, célere, azougado, sufocante. Bentinho nos leva pelos caminhos de sua vida, enlevando-nos, assustando-nos, escandalizando-nos, fundindo nossa cuca (também). Os tipos desfilam nítidos, como o esperto agregado José Dias... A rabugenta tia Rufina, Escobar, Sancha, Capitulina (que  é Capitu), e muitos mais.


A prosa deliciosa, segura, econômica e essencial de Machado de Assis excede. 

(Ano 18 n. 1 Perfil  17/05)



DOM CASMURRO A HISTÓRIA QUE MACHADO DE ASSIS ESCONDEU,Vladimir Souza Carvalho

DOM CASMURRO A HISTÓRIA QUE MACHADO DE ASSIS ESCONDEU,Vladimir Souza Carvalho, Editora Juruá, 2014, 124 páginas, isbn 978-85-362-4793-9. 

Bem que eu desconfiei!  O autor (Dom Casmurro) assumia ares de mistério, enviando veementes recados, aqui e acolá, fazendo recomendações, e na sequencia vestindo mistério. Não dizendo nada que (a meu ver) justificasse. Como quando pediu que Sancha não lesse a história a partir daquele ponto e, se o fizesse, que assumisse a responsabilidade das dores ou do que fosse.  E essa tal Sancha nem morava mais no Rio, pois reclusa na casa de familiares no longínquo e inacessível Paraná. Imaginei, na hora, que fossem iscas para instigar o leitor. Mas eram artimanhas a esconder o real acontecido, areias no braseiro com o objetivo de disfarçar o fogo. Justificativas para quem conhecia a verdadeira ladainha.


São assertivas de Vladimir Souza Carvalho, no papel de cirurgião cuidadoso, psicólogo e cientista das verdades ocultas.  Paciente, didático, renitente.  Martelando e martelando. Até martirizando sem pena (que me perdoe) nos capítulos 1, 2 e 3.  Ele coteja o romance original de Machado e toda literatura a ele referida.  E no seu trabalho feroz, Vladimir descartou verdades de que eu tinha como líquidas: que Bentinho e Escobar mantinham uma vida secreta e amorosa; que Ezequiel  (o pomo da questão) nascera de uma união fortuita entre Escobar e Capitu; que Sancha não era uma insossa coadjuvante no cenário; que o desterro de  Capitu na Suiça havia sido o castigo pelo adultério.

E Vladimir elucidou dúvidas que me incomodavam: Por que a fotografia de Escobar (que chifrou Betinho) permaneceu no escritório deste, por toda a vida? Por que o Machado (dom Casmurro) salientou tanto um casual aperto de mão (de Sancha em Bentinho) na véspera da morte de Escobar (esposo de Sancha)? 

 A meu ver, Vladimir escondeu (também) pontos que eu precisava entender melhor, que eu também, em solidariedade, não os revelo. Talvez ele pretenda prosseguir dissecando este surpreendente Dom Casmurro, cavando mais ainda.  Aguardemos mais ouro nas ricas minas de Belchior, que, finalmente, vem produzindo, na Serra de Itabaiana, graças ao prolífero e competente intelectual.

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Para ler o livro de Vladimir (A História que Machado de Assis Escondeu) é bom ler antes Dom Casmurro original.  Ou, pelo menos tê-lo à mão para consultas. A não ser que o leitor seja também um Vladimir. (Perfil Ano 18 número 1).  


DOM CASMURRO:   A HISTÓRIA QUE MACHADO DE ASSIS ESCONDEU, Vladimir Souza Carvalho,Editora Juruá, Isbn – 978-85-362-4793-9. O que será que Machado escondeu em seu livro “Dom Casmurro” e que Vladimir descobriu e quis nos contar?  Passam pela minha cabeça: Algo mal resolvido entre Escobar e Bentinho, um presente que Escobar e Capitu resolvem dar ao amigo (de Escobar) e marido (de Capitu); Algum parentesco (não declarado, estou tentando livrar a pele de Capitu) entre Capitu e Escobar...
Por que diabos o filho de Capitu e Bentinho é tão parecido com Escolar, o vizinho e amigo do casal?
O livro de Vladimir está chegando às livrarias (pois foi lançado em festa concorrida na Academia Sergipana de Letras, no último dia 24). Já o tenho, e li. Um ensaio de fôlego                que enriquece e muito a história da literatura brasikleira.  (Perfil  17/05).






quinta-feira, 7 de abril de 2016

25 MINUTOS, A VIDA DE CHIARA LUCE BADANO, Franz Coriasco

25 MINUTOS, A VIDA DE CHIARA LUCE BADANO, Franz Coriasco, tradução de Irami B. Silva,Cidade Nova, 2013, 125 páginas, isbn 978-85-7821-132-5


Euclides Oliveira deu-me o livro. Euclides  é amigo da cultura (lê ininterruptamente e possui uma biblioteca onde ponteiam livros de autores sergipanos)  e é meu amigo particular (sempre me acompanha às reuniões da Academia Itabaianense de Letras e,  em paga, eu o acompanho às reuniões da sua Academia Lagartense de Letras). Não só por isso, por muito mais.

Ele comprou dois exemplares, achando que se tratava da vida de Chiara Lubich, uma santa nova (acho que nem santa é ainda) que dá seu nome a uma praça de Itabaiana. Intrigava-me e à ele (Euclides)  esse nome estrangeiro e insólito batizando um logradouro em uma cidade rude socada no meio do sofrido nordeste brasileiro. Esparsas informações apenas dadas por Edson Passos, o empreendedor imobiliário autor da obra e pelo Google. Insuficientes.

Na ânsia de conhecer Chiara (não é que eu queria muito), após lidas trinta páginas é que percebi o logro. O livro não narrava a biografia de Lubich, mas de outra Chiara, de sobrenome Luce Baldano. Também quase santa, o processo de beatificação corre no Vaticano.

Não foi por isso (enganado com as chiaras), mas, a partir da página 43, andei pulando trechos, fazendo uma leitura dinâmica ao meu modo.  Talvez para não sofrer com essa Chiara Luce, vitimada aos dezoito anos, em plena juventude, com um tumor cancerígeno, o “osteossarcoma”. Que nome, hein! Vade retro!  Os 25 Minutos fazem referência à primeira sessão de quimioterapia. Mundo cão!

O autor, Franz Coriasco, sempre está lembrando ser agnóstico (nem acredita nem nega a existência de Deus), enquanto escreve sobre uma santa da Igreja. Eu desconfio de todo agnóstico que apregoa ser. Parece falso. Meio pedante. Como se estivesse fazendo um tipo, querendo aparecer, cultivando um diferencial raro e meio intelectualizado. O charme das aparências!

Vocês já viram algum homem simples dizer-se agnóstico? Recentemente eu  tive acesso às cartas escritas por Acrísio Torres Araujo, um imortal da Academia Sergipana de Letras falecido recentemente, que se dizia agnóstico, à um amigo, esse católico fervoroso.  A impressão que me ficou, lendo seus textos, era de que ele acreditava e não negava em absoluto a existência de Deus. Muito mais do que o missivista católico fervoroso!

E o livro?

Quando alguém protela a entrada na igreja, está procurando escapar da missa. Quando alguém demora demais a puxar o gatilho, é porque não vai matar. Tanto arrodeio! Será que estou com medo de escreve sobre o livro?

Chiara Luce está a poucos passos da beatificação. Ela sempre trabalhou pelos pobres do mundo, dentro da sua modéstia. Integrou-se aos movimentos da outra Chiara. Organizava campanhas, doava seus singelos bens aos pobres do Benin, aos pobres do mundo carente. Exercitava a santidade com seus poucos bens. Um farol que, da pequena Sasselo, uma aldeia modorrenta da Ligúria italiana, alumiava o mundo sofrido.

Um carro roubado cheio de malas à caminho do hospital porque passaram na igreja para rezar.  O cãozinho migalha que conforta nos momentos duros, que não foram poucos. A fé reforçada pela graça não alcançada. O ser humano aprendendo a viver. Até a morte precisa ser aprendida, como dizia Tereza de Lisieux:  “antes de morrer à golpe de espada,  é preciso saber morrer a golpe de alfinete.”. Também a santidade, ela precisa ser aprendida cada momento:  "Serei santa se eu for santa agora” (Chiara Luce, quando lhe faltavam apenas quatro meses de vida).

25 Minutos é, também, além da história da vida de hiara Luce Badano,  um manual de procedimentos para se chegar à santidade,  "esse negócio misterioso, indefinível e fascinante como nenhum outro".

Vamos lá?








quarta-feira, 6 de abril de 2016

O MAIOR GUARDA-SOL DA CIDADE e outras crônicas, Juraci Costa,

O MAIOR GUARDA-SOL DA CIDADE e outras crônicas, Juraci Costa, J.  Andrade, 220p, 21 cm, 2015, isbn
978-85-8253-106-8


Esparsamente, ouvia falar desse cronista de Itabaianinha, sempre bem, elogiavam sua escrita interessante. Recentemente, Artur Oscar de Oliveira Deda citou-o de passagem, ao me apresentar (de longe) seu novo livro sobre os bastidores da justiça sergipana que estava para sair (talvez já tenha saído e eu nem soube, dar nisso não pertencer ao “jet society” da cidade!)..

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Nunca havia lido nada escrito por Juraci nem o vira jamais, mas ele não era um desconhecido para mim.  Habitava algum canto de minha mente devido à essas esparsas notícias. Qualquer escritor precisa dessas sementinhas plantadas, pequenas referências.  Por causa disso, eu parei diante do livro de JuracI exposto em uma prateleira da livraria Escariz. Outros livros o encobriam parcialmente, mas o nome Juraci mostrava-se por uma fresta. Afastei os espelhos sem luz e descobri o Maior Guarda-sol da Cidade.

Folheei-o, querendo comprovar a boa expectativa que me habitava. Depois fui ao caixa e comprei o livro. Também porque gostei do zoar das folhas, dos trechos que bisbilhotei rapidamente, da capa cor de caramelo crocante...  Porque já era, mesmo sem eu saber, um livro esperado por mim.

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Bom, vamos ao autor e ao livro. Juraci já andou bastante, publica livros desde 1997, quando estreou com a novela Urucumã. Depois vieram Contos da Província em 1999; Um Homem de Negócios em 2001; História de Itabaianinha em 2003; Zé Belo e outras figuras em 2005; Portas Abertas em 2009.
Não é nenhum noviço, é quase bispo. Se não, um velho pároco escolado.  

Ele é oficial de Justiça em Itabaianinha, sua terra natal, e a maioria das crônicas acontecem em sua terra (Taquarana) e falam do seu ofício. Artur Deda, juiz em várias cidades de Sergipe, deve ter convivido com esse ermitão introspectivo, daí tê-lo citado naquele dia que o visitei.

A meia centena de crônicas (ou casos) são contatos naturalmente, com uma escrita suave, fácil de entender. Seriam reais ou criados pela mente pródiga do autor? O que importa é que são, na sua maioria, cheios de vida e que seguram leitor até a última página.  Mostram um povo alegre, irônico, sagaz, até atônito e submisso ante a Lei implacável da qual o autor é o agente do medo. A visita de um Oficial de Justiça é sempre temida. Ou quase sempre.

Andei me perdendo nas primeiras crônicas, como em Apelo em Vão, a Velhinha, e na Última Visita, esta que abre o livro.  Mas fui em frente. A partir de Cinemas já me ambientara e os casos correram macios, batendo-me com pérolas aqui e acolá. 

Ouso dizer que os causos mereciam um melhor tratamento no fecho, no encerramento. Sempre é recomendável deixar algo no ar, evitar o óbvio, como a derradeira frase de O Mirante do Bom Lucrar. A última impressão é a que fica. Penso que um bom texto pode cair no esquecimento logo-logo, se for abandonado apenas, nas últimas linhas; não for bem terminado. Como os sonetos, como os discursos.   

Livros às Mancheia é pequeno e doloroso. Um poema. O Parque da Sementeira levou-me assustado à Minha Querida Aracaju Aflita. Há algum link misterioso entre Saracura e Juraci?
Velhos termos pularam à minha frente, quase vou abraçá-los nunca mais os ouvira e sempre foram meus também, como “Pé estrompado” em Um Homem Escolado.

Juraci Costa escreve sobre nossa gente e nos leva ao seu mundo real ou imaginado. Pungamos na sua motocicleta ligeira e vamos atrás dos indiciados perdidos nas brenhas de Taquarana. Ninguém nos escapa, nem os que se envultam atrás de portas ou se apagam sob apelidos bizarros; mesmo que tenham corrido para Aracaju, um sem fim de veredas se cruzando, andando lado a lado e até sobrepondo-se, agora com o Vlt do prefeito querendo ser reeleito. O azul vai suspender o tráfego do chão. Ou não?

Gostei de ter encontrado seu livro, Juraci!

Desculpe-me alguma indelicadeza, escapou sem querer, a idade avariou o rigor dos filtros por onde flui minha escrita nevoada.